lunes, 19 de diciembre de 2011

E AGORA PACHECADA?



No Brasil existe uma espécie muito abundante de jornalistas esportivos, os jornalistas pachecos. Aqueles que adoram enaltecer as qualidades do “poderoso futebol brasileiro” e menosprezar os demais países.

A pachecada é extremamente resistente a elogiar feitos extraordinários de jogadores e equipes internacionais. Para estes ufanistas parece que sempre lhes faltará a categoria que só os brasileiros têm, quase que por desígnio natural ou divino. Negar isto seria quase uma blasfêmia. Maurício Noriega, um nobre representante da classe dos pachecos, por exemplo, afirmou há pouco, no Twitter, mais ou menos com estas palavras, que se incomodava que “havia muitos brasileiros comportando-se como macaco de circo de europeus”, por uma suposta desproporcional reverência que se fazia de alguns times e futebolistas que atuam no Velho Continente.

O jornalista pacheco tem duas características básicas, a arrogância e a ignorância. Arrogância por não aceitar que brasileiros podem ser inferiores a não-brasileiros. E ignorância por opinar sobre o que não conhecem, pois não acompanham futebol internacional.

Um caso paradigmático da fúria dos pachecos é o que pensam (ou pensavam) do Barcelona, do Real Madrid e da liga espanhola em geral. Como é de conhecimento de quem acompanha futebol, tanto o Barça como o Madrid soem vencer com facilidade seus adversários no seu campeonato local, e nas últimas temporadas monopolizaram a disputa pelo título deixando os demais 18 clubes muito para trás em termos de pontuação. A conclusão que os pachechos chegam é esta, “na Espanha só tem dois times, o Barcelona e o Real Madrid. O resto é porcaria, do nível dos times pequenos que disputam o Campeonato Paulista.”

Uns até sugerem que o Barcelona e o Real Madrid não são tão bons como os pintam. Recentamente, no programa Esporte em Discussão, da Jovem Pan, duas pérolas mostraram isto (http://jovempan.uol.com.br/esportes/programas/esporteemdiscussao/2011/12/o-sao-paulo-tera-um-2012-melhor.html minuto 9 e minuto 32). Primeiro, Fábio Sormani disse que o argentino Di María, do Real Madrid, seria um Fernandinho (atacante reserva do São Paulo) que fala espanhol. Já Bruno Vicari quis comparar Xavi e Iniesta a Mazinho e Zinho, dizendo que a dupla barcelonista não seria superior à dupla que defendeu o Palmeiras nos anos 1990. Tanto Mazinho como Zinho eram muito bons, mas quem vê o Barcelona sabe que Mazinho e Zinho não tinham nem 50% da maestria e fineza no toque de bola, nas tabelas e na visão de jogo dos baixinhos culés.

A goleada sofrida pelo Santos na final do Mundial de Clubes este domingo talvez leve os pachecos a um terreno mais próximo da realidade ou, então, os leve à depressão profunda. No primeiro caso, dar-se-iam conta que o Barcelona é simplesmente fantástico e que a debilidade dos seus rivais na liga espanhola se deve mais aos méritos da equipe azulgraná que a fraqueza dos oponentes (que até pode existir em alguns jogos, mas que não seria regra). Ao fim e ao cabo, até mesmo o campeão da Libertadores, o Santos, do tão elogiado Neymar, não foi páreo para o conjunto catalão. No segundo caso, se quiserem manter a tese de que os times da liga espanhola são horríveis por não serem capazes de fazer frente ao Barcelona e ao Real Madrid, então, por uma questão de coerência, terão que dizer que o Santos também é imprestável e os outros clubes brasileiros, teoricamente inferiores ao Santos, são piores que isto.

Valorizar o futebol brasileiro não significa, necessariamente, cultuá-lo (dizendo que o Campeonato Brasileiro é o máximo só porque é muito equilibrado) ou achincalhar o futebol praticado fora do Brasil. Só se pede mais ponderação. Ninguém pode negar que o Campeonato Brasileiro é o melhor das Américas e que antes da Lei Bosman, no fim dos anos 1990, poderia ser considerado, mesmo, o de melhor nível técnico do mundo. Assim como deve ser reçaltado que o nível dos grandes campeonatos nacionais da Europa é superior à qualidade da seleção nacional do seus países, em razão da grande presença de estrangeiros nas agremiações européias, fato que ganhou uma dimensão brutal após a Lei Bosman, que, na prática, liberalizou o mercado de transferências, extinguindo a Lei do Passe (extendida a todo o mundo) e harmonizou as leis da União Européia de livre circulação de pessoas ao futebol. Tudo é uma questão de relativizar e matizar os fatos, ao menos para quem queira fazer um jornalismo sério.

Oxalá, os pachecos façam uma reflexão e uma autocrítica de tudo o que têm falado ultimamente. Mas temo que isto não seria possível, já que iria contra a própria natureza do pachequismo. Terão mesmo que tentar extirpar o pacheco que vive dentro deles. Tomara que o massacre do Santos contra o Barcelona os anime a isto. Assim como Lênin dizia que o esquerdismo era a doença infantil do socialismo, pode-se dizer que o pachequismo é a doença infantil do jornalismo esportivo brasileiro.

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