miércoles, 25 de febrero de 2015

DA SEM-VERGONHICE

Poucos jornalistas brasileiros, ao menos dos que estão nas principais ligas do periodismo, trabalham tão em prol da promiscuidade entre informação e propaganda como Milton Neves.

Mesmo quem não se interesse pelo setor do jornalismo em que milita há décadas, o esportivo, deve já ter reparado na quantidade de publicidade que há em seus programas, tanto na rádio, como na TV. Concretamente em forma de merchandising, esta forma de publicidade não tradicional em que um jornalista fala de uma determinada marca ou empresa dentro do espaço do programa e fora do espaço de intervalo comercial.

Sem dúvida, Neves pode ser considerado como o rei de merchandising no Brasil. Um programa de humor até fez um personagem baseado nele chamado Merchan Neves.

Neves não tem nenhuma vergonha da dupla atuação, no campo da publicidade e do jornalismo. Muito pelo contrário. Neves é dono duma agência de publicidade. É por meio dela que capta os anúncios para o programa cuja marca é de sua propriedade, o Terceiro Tempo.

Se já é reprovável qualquer mínima publicidade que um jornalista faça, mesmo a que faça num anúncio publicitário fora dos programas em que labora, o que faz Neves pode ser catalogado no âmbito do ultraje. Infelizmente, Neves está longe de ser o único que mistura publicidade e jornalismo. A maioria das rádios e TVs do Brasil têm os chamados testemunhos. Ou seja, jornalistas que fazem o merchandising durante as emissões. Esta triste prática não é exclusividade do Brasil. Em toda América Latina ocorre a mesma coisa.

No Brasil, como no resto da região, são muito poucos os jornalistas que criticam isto. Em Terras de Vera Cruz, o único que predica contra a mistura de jornalismo e publicidade é o jornalista Juca Kfouri. Não por acaso, Neves tem em Kfouri um grande inimigo.

Acostumado a destilar promiscuidade a torto e a direito, Neves deve ter ficado muito surpreendido, quando, nesta terça-feira, na sua participação no programa matinal da Band News FM, apresentado pelo jornalista Ricardo Boechat, este repreendeu-o vivamente após Neves falar sobre um projeto esportivo do empresário João Paulo Diniz. Neves falava do projeto como se, de fato, estivesse fazendo um relato informativo, ultrapassando em desfaçatez os seus habituais merchandising. Boechat não deixou barato, interrompendo-o, e dizendo: “Milton, manda o Diniz botar um anúncio”.  Neves ainda tentou desconversar, dizendo que não era anúncio, mas Boechat não aceitou suas desculpas esfarrapadas.

Infelizmente, Boechat junto à coapresentadora do programa, Tatiana Vasconcelos, decidiram rapidamente cortar a discussão, que começava a pegar fogo (principalmente da parte de Boechat, pois Neves ficara muito acuado para fazer frente a ele) para falar de outro tema. 


Ainda que tenha durando apenas três quartos de minuto, a enquadrada de Boechat em Neves foi dos momentos mais épicos do jornalismo brasileiro nos últimos tempos. Uma aula de ética que deveria servir de lição a todos os jornalistas e aspirantes a sê-lo. Ademais, pela primeira vez sua sem-vergonhice ficara em evidência em plena prática desta.



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